Amor de chocolate - parte 3

    A mensagem retirada do lixo pelo cão Bob teve um efeito explosivo em Esther. Dissiparam-se as dúvidas. Um encontro com John, para eliminar as arestas possivelmente existentes, era uma necessidade urgente. Ela tratou de pegar um avião e rumar a Londres para, olho no olho, combinar o futuro com John.
    Na capital inglesa encontrou John um pouco abatido. Não conseguira a almejada aprovação no exame teórico de direito. Se quisesse seguir a carreira teria que se submeter a cinco anos de prática profissional em um país pobre e subdesenvolvido muito distante do continente europeu. 
    Joseph, irmão gêmeo de John, é quem conseguira a vaga tão almejada durante os longos anos de dedicação aos estudos. John estava agora entre a faca e a espada. Se ficasse em Londres eliminaria um sonho acalentado desde os primeiros anos de vida. Se partisse para o destino que lhe apontavam perderia Esther definitivamente. 
    Estava equivocado... Não perderia Esther. Ao embarcar para Londres a jovem atleta alemã levava uma certeza... "John é o meu destino... John é a minha realização... O que ele decidir, neste nosso reencontro, é o que está destinado para mim."
    John, que já imaginava ter irremediavelmente perdido a amada Esther, mostrou-se estupefato ao vê-la, de repente, a sua frente. "Meu amor... Me diga que não estou sonhando... Me diga que você está aqui... Me diga que veio aplacar a minha tristeza."
    Esther, feliz, ressuscitou as esperanças do seu amado... "John! Eu estou aqui para lhe dizer que, depois de todas as avaliações possíveis, conclui que você é o meu caminho. O meu companheiro. A pessoa com quem devo dividir os meus sonhos e as minhas realizações. A pessoa que deve dividir comigo os seus sonhos e as suas realizações."
    Casamento e ousadia
    O casamento de John e Esther, em Londres, foi um acontecimento gratificante. Sabedores da imediata partida do casal, para país distante, as pessoas não pouparam manifestações de amizade e carinho. Estavam, então, os dois jovens prontos para o desafio que tinham pela frente. 
    Um cenário tórrido. Areia, sol, gente sofrida... Miséria... Falta de alimento e produtos outros essenciais para a manutenção da vida com um mínimo de dignidade. John e Esther haviam chegado ao destino que lhes tinham indicado. A vontade, de imediato, era desistir de tudo e retornar à Inglaterra, mesmo que a carreira sonhada não pudesse ser seguida. A obstinação dos dois jovens, porém, prevaleceu.
    Em menos de uma semana o casal inglês, admirado e cortejado pela população anfitriã, ganhou o nível de estímulo que precisava para enfrentar aquele desafio. A população do país pobre e subdesenvolvido tratava John e Esther com reverência. Isto fez com que os dois, no passar do tempo, se sentissem compensados por aquela missão que, em princípio, tinha sido encarada como punição. 
    John e Esther, cercados do carinho da comunidade que os acolhera, passaram a sentir que toda felicidade estava ali concretizada. Em termos afetivos nada mais tinham que sonhar. Só precisavam fazer com que a população do pequeno país também experimentasse, pelo menos um pouco, da felicidade que tinham o privilégio de vivenciar.

    Um novo motivo
    Envolvidos com a necessidade de assistência da população do pequeno país John e Esther chegaram a considerar secundários os seus próprios sonhos/interesses. Tanto que Esther só se deu ao luxo de raciocinar sobre o papel de mãe quando estava prestes a ter o seu primeiro filho.
    James nasceu um ano e meio depois da chegada de John e Esther ao miserável país. Imagine a felicidade... Um menino, de olhos azuis vibrantes, chegava como uma dádiva dos céus para compensar todos os sacrifícios. Estava ali a nova fonte de esperança. James era o complemento da relação que surgira nas arquibancadas de um estádio nas olimpíadas de Pequim. 
    John, estudioso e profissional recatado, conquistou as simpatias das autoridades do país onde estava residindo. As autoridades sentiam um visível prazer de compensar todo o esforço que constatavam da parte do dedicado profissional da advocacia. Isto fez com que a vida do casal John/Esther fosse suave mesmo em meio a uma miséria inadmissível.
    Foram imensos os esforços de John na missão que lhes impuseram. Nenhuma falha, contudo, ele ousou cometer. Muito pelo contrário... Se esperavam nota quatro ele apresentava desempenho para dez. Foi assim que galgou as posições impostas pelos coordenadores dos seus estudos. Foi assim, também, que conquistou todas as condecorações possíveis, a um profissional do direito, no país que lhe significava um teste. 
    Grau máximo
    Jamais um inglês estudioso do direito mereceu tantos méritos quanto John. No país pobre e subdesenvolvido, onde cumpriu as últimas etapas de sua formação, foi merecedor das mais elevadas condecorações. Parlamentos... Assembleias... Governos... Os mais elevados órgãos do pequeno país consubstanciaram as ações do casal John/Esther com as medalhas máximas já instituídas.
    O ainda jovem casal podia se considerar realizado. Sentia, contudo, que a missão que lhe haviam confiado ainda não estava plenamente cumprida. Foi aí que John e Esther resolveram colocar na família duas pessoas a mais. James, com dois anos de idade, ganhou assim dois irmãos: Akia (três anos) e Abena (dois anos).
    Os dois novos membros da família estavam em situação de abandono total depois da morte dos pais pelo implacável vírus Ebola. John e Esther não podiam admitir que, premiados por tanta felicidade, deixassem alguém a mercê de um destino que se mostrava muito cruel. Face a este raciocínio Akia e Abena se tornaram irmãos de James e, no regresso à Inglaterra, experimentaram o que de bom é possível viver em uma pátria livre do ocidente. 
    Esther, uma renomada atleta alemã, deixou no pequeno país imagens fotográficas e cinematográficas de apresentações que fazia, de forma espontânea, para aliviar a tristeza daquela população. Sentia que a sua ginástica artística fazia os corações baterem mais forte... Promovia, entre as jovens da plateia, o acalento da esperança de um dia fazer algo igual.
    A jovem atleta alemã deixou saudade e sementes muito frutíferas. Esperava que, alguém do governo ou do setor educacional, acatasse a mensagem que, com sua abnegação, procurava transmitir. Medalha - ouro, prata, bronze... - é possível. O início da busca dessas conquistas só se dá com justiça. Justiça é indispensável.
    Reencontro com a pátria
    Todo sacrifício de John/Esther foi compensado no retorno a Londres. As condecorações merecidas ao longo do seu teste, no país pobre e subdesenvolvido, longe do continente europeu, renderam a John o mais elevado grau da advocacia inglesa. Uma posição, digamos, cem vezes maior do que a que obteria se tivesse conseguido a aprovação nos exames teóricos.
    John estava, finalmente, com a sua carreira profissional coroada do mais pleno êxito. Esther, ao lado do seu amado John, nada tinha a desejar. Jamais perderia o gosto pela ginástica artística. Essa lacuna, entretanto, ela preenchia com lições a possíveis seguidoras, a partir da sua mudança para Londres. A capital inglesa tinha conquistado uma preciosa orientadora para quem quisesse sonhar com o brilho, um dia, em uma das famosas olimpíadas internacionais.
    Tudo perfeito... Tudo consolidado... Tudo superado... John e Esther embalavam-se no pátio da bela casa em Londres enquanto observaram os filhos em brincadeiras inocentes e descontraídas. É incrível como James tinha afinidade com Akia e Abena. A vida podia parar naquele instante. Nada mais a se almejar. Era tudo perfeito.
    Esther dá um beijo no rosto de John e diz, baixinho, ao seu ouvido: "Veja que bonitas as nossas crianças. Se puxarem ao pai vão ser transformadoras. Um dia Akia e Abena poderão retornar à sua pátria para lutar pelos avanços positivos que ela merece."
    John, sem um minuto de relutância, coloca: "Se eles voltarem iremos juntos." (Autora: Aline Brandt - Todos os direitos reservados/Lei dos Direitos Autorais N° 9610/98)

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